MENINO DE VIDRO AZUL
Um dia, estava chovendo e não pude sair para brincar com as minhas amigas. O marido da dona da casa bateu na porta mas fiz que não ouvi. Ele disse que sua esposa queria falar comigo e foi embora. Fiz Nilson dormir, estava abrindo a porta para ver o que ela queria. Ouvi uma voz dizer:
— Não vá!— pensei: Estou ficando louca!
A porta da casa deles estava aberta, fui entrando, chamei por ela, ouvi a voz do marido:
— Ela está no quarto.
Entrei no quarto, deparei-me com ele só de cuecas. Pedi desculpas e fui saindo rapidamente. Ele me agarrou pelas costas, gritei:
— Me solte, por favor!
Quanto mais eu tentava me soltar, mas forte ele me segurava. Jogou-me sobre a cama e, por mais força que eu fizesse, não conseguia soltar-me.
— Oh! Deus, me ajude por favor!
Alguma coisa o puxou de cima de mim. Saí correndo, entrei em casa, bati a porta e tranquei. Ele veio atrás e batia na porta .
— Abra a porta, quero te explicar! Não ia te machucar.— Sentei no chão, tremia, chorava.
— Vai embora! Se não vou chamar a vizinha.
— Eu vou, mas não conte a ninguém, se não vai se ver comigo!— Fiquei encolhida na parede, chorando. Senti que havia alguém me olhando. Ergui a cabeça, estava ali o menino feito de vidro azul.
— Não tenha medo! Pare de chorar! Não vou deixar ninguém fazer mal a você.
— Quem é você?
— Seu anjo guardião, levante, vá lavar o rosto.
Levantei, fui até a pia, abri a torneira, não saía água. Olhei para trás. Ele caminhou em minha direção, eu me encolhi.
— Nunca tenha medo de mim! Sempre que estiver em apuros estarei ao seu lado. Abra sua mão em forma de concha. Ele derramou água da flor em forma de copo-de-leite.
— Lave o rosto. Esta água lhe dará paz e fará você esquecer.
Quando tirei a mão do rosto, abri os olhos, ele não estava mais ali.
Já escurecera quando Amélia chegou do trabalho. Pensei em contar-lhe o acontecido, mas estava com vergonha; e o fato pareceu-me, nessa hora, sem importância para preocupá-la mais, perto dos tantos problemas que já lhe povoavam a vida.
Daquele dia em diante, eu esperava Amélia sair, pegava meu sobrinho, ficava andando pelas ruas até as minhas amigas chegarem da escola. Só para não ver o homem. Amélia descobriu que eu ficava pelas ruas e não almoçava; quis saber por quê.
— O que está acontecendo? Já lhe disse que não pode ficar na rua com o Nilson! Nem almoço você dá para ele, não vou poder confiar em você!
Baixei a cabeça chorando, não respondi. Ela pegou em meu braço com força.
— Vamos! Conte para mim por que faz isso? Eu falei que é perigoso ficar na rua.
— Aqui é mais!— falei baixinho, entre soluços.
— Por que ficar dentro de casa é perigoso? Vamos, me fale!
— Quero ir embora, não quero mais ficar aqui.— Ela abaixou a voz, ergueu meu rosto, e olhou bem para mim. Senti que ela estava preocupada.
— Alguém mexeu com você?— continuei calada.
— Por favor, fale!— Pensei: Não posso contar, tenho medo do que ele pode fazer.
— Não quer contar? Mas não machucaram você?
— Não!— ela pegou Nilson, saiu batendo a porta.
Meu coração acelerou de medo, ela descobriu! E agora? Enxuguei as lágrimas, abri os olhos, o quarto estava azul. Eu não conseguia ver os móveis tão forte a luminosidade.
— Você está aí? Por que está todo azul?
— Para acalmá-la mais rapidamente— disse uma voz.
— Onde você está ?
— No quarto todo. Por que não conta a ela?
— Tenho medo do homem.
— Já disse que não é para ter medo?
— Mesmo assim eu tenho.
— Tem que confiar mais em você. Ficará na igreja. Lá os adultos cuidam das crianças.
— Como sabe ?
— Tenho que ir.
— Espere, quero perguntar...— Amélia entrou.
— Com quem estava falando?
— Com meu anjo, ele sempre me ajuda, diz o que fazer.
— Sei! Foi ele que mandou você ficar na rua?
— Não, ele nem sabia. Agora ele falou para eu e Nilson ficarmos na igreja.
— Tá! Ficar fazendo o que lá?
— Brincando com as outras crianças.
— Cândida, por favor! Pare de inventar coisas! Sabe muito bem que esse anjo não existe. Se não parar, vou levar você ao médico.
— Ele existe, sim! Me ajuda sempre que estou em perigo; se não acredita, vá na igreja ver se lá ficam pessoas adultas para cuidar das crianças.
Bateram, ela foi atender:
— Boa noite, aqui mora a dona Amélia?
— Sim, sou eu.
— Um senhor pediu que eu viesse falar com a senhora sobre suas crianças.
— Quem era esse senhor? O que ele sabe sobre as crianças?— interrompeu Amélia.
— Eu não sei! Ele deu seu nome, endereço. Disse-lhe que estava ocupada mas ele insistiu, pediu-me que viesse, pois estaria fazendo uma caridade que Deus jamais esqueceria.
— Que jeito ele tinha?
— Não sei explicar. Ele estava vestido de azul, tinha um sorriso muito bonito.
— Não sei quem é, mas entre! Ele pediu para a senhora falar o que sobre as crianças?
— Ele falou que a senhora precisava trabalhar e não tinha com quem deixá-las. E como nós recolhemos crianças para que não fiquem pelas ruas enquanto as mães trabalham, ele me pediu que viesse perguntar se quer deixá-las com a gente.
— É uma creche?
— Não. Nós as recolhemos no pátio, damos algumas atividades, servimos duas refeições por dia; podem entrar e sair a hora que quiserem.
— Quero sim, e agradeço por ter vindo.
— Tenho que ir! Boa noite, dona Amélia!
— Boa noite! Como é mesmo seu nome?
–– Maria da Luz.
A mulher foi embora. Amélia ficou por alguns minutos olhando o vazio, pensativa, buscando alguma explicação.
Esta no livro Sarath Meu Anjo
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